27.5.09

No. 55 - Gosto de ética sem precisar de manual

Pois é... não é do meu feitio bloguístico... mas aí vai um texto que escrevi para a disciplina de ética...
ESCRITO DISSERTATIVO: Pensando a ética como conceito e sua aplicabilidade no contemporâneo. (abril/2009)

Ser ético sem manual de instruções

Gisele Cristina Voss*

Para pensar na ética, é preciso primeiro pensar no personagem que atua com ela, o homem, como um ser em construção. E o palco, o mundo presente, neste contexto pós-moderno – também em constante construção e desconstrução. As escritas atuais sobre moral e ética trazem teses permeadas por dúvidas, paradoxos e o homem repleto de escolhas. Escolhas essas que demonstram a noção de princípios e valores morais presentes nas ações humanas. Bauman (1997) em sua reflexão sobre a ética pós-moderna, fala onde se encontra a responsabilidade, quando afirma que “é a sociedade, é sua existência contínua e seu bem-estar, que se tornam possíveis pela competência moral de seus membros, e não vice-versa.” (p.41) Em conversas informais em que assuntos como corrupção e comodismo da população frente à imoralidade causam indigestão, dá para entender a que bem-estar o autor está se referindo.

Mas certas afirmações filosóficas, por mais antigas que sejam, não ficam fora do contexto atual – inclusive a noção do homem como ser de escolhas e responsável por elas, remete a Hegel, um filósofo humanista do século XVIII. Essas teorias se “encaixam” muito bem nos dias de hoje, mas infelizmente, não parecem estar fixadas em lugares visíveis para serem percebidas e seguidas. Kant (apud La Taille, 2002) diz que há dois objetivos/deveres morais para os homens: a felicidade do outro e o aperfeiçoamento de si mesmo. Se estas duas “simples” sentenças fossem consideradas em sua plenitude, não estaria sendo necessário ver tantas CPIs na política, investigações nas instituições, ou comissões de ética para penalizar profissionais.
A ética, na sua função de refletir e pensar a moral, não é simples, fácil, e nem consta com um manual de instruções. Para ser aprendida e apropriada, deve existir e se relacionar com o homem desde seus primeiros contatos sociais e construções de conceito. Platão (apud Camarato, 2006) já ressaltava que o “mais importante na organização social é a educação das crianças, pois é isto que forma a consciência cidadã. Sem ela as leis serão sempre ineficazes.” (p. 18) Este processo de aprendizagem não se acaba na infância, ali se planta sua base. La Taille reflete a respeito dos limites, colocados de forma adequada, e não sendo eles os “construtores” da noção de moral e princípios, e sim, para ele “educar, civilizar a criança, deveria ser antes reforçar as tendências, por assim dizer ‘pró-sociais’ do que envidar todos os esforços na repressão e na disciplina.” (2002, p. 53) Essa forma “pró-social” de se apropriar de valores seria a mais apropriada, para garantir uma relação verdadeira e respeitosa, entre todas as subjetividades existentes.
Vive-se em um mundo plural, com indivíduos de todos os tipos. Porém, isso não significa que cada indivíduo tem que viver de forma individualista. Porém, não é o que acontece. É paradoxal o que se observa: quanto mais pessoas aparecem, mais individualistas elas parecem. Pode-se pensar na relação que essas ações têm com o sistema social econômico vigente, com um mundo capitalista competitivo, valorizando a superação do outro, esquecendo de superar a si. A generosidade não é estimulada, dando lugar ao egoísmo. Sendo assim um caminho oposto aos objetivos sugeridos por Kant, ou sobre as ideias e valores éticos que são trazidos nas teorias e discussões acadêmicas. Lipovétsky (apud Bauman 1997) afirma que “a nossa era é era do individualismo não-adulterado e de busca de boa vida, limitada só pela exigência de tolerância (quando casada com individualismo autocelebrativo e livre de escrúpulos, a tolerância só se pode expressar como indiferença). A era que vem ‘depois do dever’ só pode admitir uma moralidade muito ‘minimalista’ e em declínio.” (p.07) Moldada pelos valores universais e essenciais seria fácil viver de acordo com a ideia de que a “ética é obediência do que não é obrigatório” (material de aula), porém, com os valores em dúvida, e cada vez parecendo mais distantes do ideal e imperativo categórico de Kant, a dificuldade de a ética estar naturalmente inserida nas relações cresce a cada momento. Desde a antiguidade na Grécia já se “deliberava que o exagero de leis escritas denotava um enfraquecimento dos costumes e, portanto, uma degenerescência social.” (COMPARATO, 2006, p. 18) E aí, o que fazer?

Enquanto vivermos num mundo em que inclusive a lixeira do prédio tem que ter cadeado, não sei o que fazer. É fato que a ética e a moral tem relação intrínseca com os Direitos Humanos, da visão da pessoa como PESSOA. Essa reflexão sobre a lixeira remete a idéia das classes sociais, do capitalismo, do totalitarismo, das ideias que vieram com a burguesia onde a propriedade – o TER – definia a forma de relação e respeito – ou ausência dele – com o outro. A necessidade de trancar a lixeira é “justificada” pela “bagunça que os ‘catadores’ fazem, e assim os lixeiros não recolhem”, na resposta de um síndico. Mas o que justifica a necessidade de alguém precisar mexer naquele lixo? Isso fere a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 (apud Camarato, 2006) na norma do artigo VI: “Todo homem tem direito de ser, em todos os lugares, reconhecido como pessoa perante a lei.” (p. 26) Se a essência dos direitos humanos é o direito de ter direitos, como disse Hanna Arendt (apud Camarato, 2006), toda reflexão sobre moral e todas as questões éticas seriam menos complexas e utópicas, se preceitos básicos que vêm desde a antiguidade, fossem respeitados.
Não parece que na era pós-moderna essas reflexões vão diminuir, e a necessidade da ética de pensar sobre a moral terminará. Fica, para todos nós, continuarmos nessa reflexão, para entrar na história junto de Locke, Rousseau, Kant, Hegel, Arendt, Marx, Bauman, La Taille e até Gandhi, que nos ajuda a encerrar esse ensaio com a lição: “As qualidades próprias do homem são a verdade, a justiça e o amor.” Se essa frase parecer piegas e fora de moda para você, já está na hora de rever seus valores.

Referências Bibliográficas:
AMADEU, Sérgio. A realidade Matrix e a alegoria da caverna.
BAUMAN, Zygmunt. Ética pós-moderna. Paulus: São Paulo, 1997.
LA TAILLE, Yves de. Limites: três dimensões educacionais. 3. Ed. Ática: São Paulo, 2002. livro muuuito bom
Ética, proposta para reflexão. Publicação do sistema FIEP-PR. Curitiba, 2007. (com resumo sobre o livro CAMARATO, Fábio Konder.
Material de aula – slides enviados por e-mail. (referências diversas...)

*Estudante de Psicologia, 5º. Período, Universidade Positivo.

Fotos de um dia de ética agroecológica, música e amizades. 12-05-2009 Ctba

Outra leitura interessante que tem a ver.. sobre a luta antimanicomial de um dos meus blogs favoritos:
http://euparadoxovivo.blogspot.com/2009/05/loucura-loucura-dia-nacional-da-luta.html

25.5.09

No. 54 - Ensaio sobre a preguiça

(deliberadamente parodiando Saramago...)

O homem de terno preto chegou em casa, entrou na sala, sentou no sofá. Ao dizer oi para sua esposa, parou, Estou com preguiça, Sim meu querido, é normal sentir isso, Não querida, essa preguiça é diferente, não tenho vontade de me levantar daqui, E ela saiu, foi para cozinha, rindo da piada, Naquela manhã, ela já não trocou mais seu pijama.


Depois de 40 dias, só se via crianças na rua, a brincar.


E o escritor sentiu-se contagiado e ficou com preguiça de term








. Gisele Voss - 25/05/2009, 20:10 (de pijamas)
foto de casa, em Passo Fundo, abril 2008 (quarto) e dezembro 2008 (porta)
Ref. SARAMAGO, José. Ensaio sobre a Cegueira.

16.5.09

No. 53 - Gosto da Aspirina

E na rua XV fui caminhando, observando nas cruzadas com as transversais, o que os manifestantes da Caminhada de Jesus estavam fazendo na Av.Marechal Deodoro, ao mesmo tempo q nas cruzadas com os transeuntes, buscava indícios de que o cortejo ainda me esperava.
As batidas de tambores mais a frente, ao lado estátuas humanas e quadros de cores, me fizeram sentir o coração ali, onde estava sempre, mas que eu não tinha percebido a intensidade.
Porém, ao se aproximar, o cortejo não era tão grande e amedrontador, tampouco aconchegante. Era um círculo, ok, meio círculo, de narizes de borracha e Plástico. Roupas coloridas, instrumentos e pernas de pau completavam o meio círculo, A circunferência total era formada com o público, suficiente para fechar a roda.
E eu, de fora, permaneci de fora.
Observei, ganhei um oi tímido de um, sem nariz, q tocava tambor. Mas tampouco me senti convidada.
E eu, de fora, permaneci de fora, e olhei pra fora. E percebi um palhaço, de longo casaco amarelo, fora da roda.

Resolvi observar o todo, sentir, e sentir vergonha. E à medida que a timidez foi aumentando, grudei do lado de um cavalete cheio de obras coloridas, puxei meu chapéu vermelho, e respirei. Porque lembrei que respirar ajuda nessas horas. Segurando o narizinho de borracha emprestado numa mão, espiei em volta e peguei o espelho da base do batom, e vi minha pele ser coberta de 3 bolinhas na bochecha esquerda, e três riscos abaixo do olho direito (apesar de parecer o contrário no super grande espelho redondo). A calça de retalhos pretos entrou na meia, parecendo bombacha gaúcha, para ter uma base conhecida...

O nariz veio de encontro ao meu rosto, e a respiração passou a ser emborrachada.

A Aspirina então foi de encontro ao palhaço Siricotico, e dali em diante descobriu a rua Xis Vê...


Entre flores de papel higiênico, fotos de bonde, apertos de mãos de estátua, disseram bom dia, e receberam bom dia de pessoas de todo lugar do Brasil, exceto de uma cidade, que sentia muito frio para abrir a boca, nem q fosse um simples sorrir.



Sorrir, que verbo lindo reproduzido em idades e tons naquela rua de calçada preta e branca. Indo pela sombra, na busca de sol para quebrar o gelo, o sorriso, carinho e sinceridade dos dois palhaços, aqueceu o outono.


Palavras, músicas, até poesia de rua, balão um dentro do outro, gêmeos de 2 aninhos, bolhas de sabão, anúncio de almoço ou bilhete premiado. Premiados.

Aspirina não sabia que podia, assim, dizer tanto e sentir outro tanto. Até pegar caron - quando não tinha o tambor de água na bicicleta do pólo norte.


Que sutil dizer bom dia. Que sutil caminhar e olhar no olho.



Que doideira receber um sorriso, simplesmente por ter sugerido, em pequenos detalhes, que o mundo não precisa estar sempre igual.

A mudança singela no jeito da roupa, do rosto e de uma pequena máscara no nariz, a(me) permitiu se relacionar.


O gelo derreteu!


16 de maio de 2009-05-16 22:48
Depois de um dia no festival curitibano de circo.
Relato de Gisele Voss, sobre a experiência diurna, das 10:35 às 12:00, de participar do Cortejo Circense, ou seguindo atrás dele, caminhando da Boca Maldita até as escadarias da UFPR, pela rua XV de novembro.

links:
www.narizvermelhoanima.blogspot.com
http://www.casadopalhaco.com/

11.5.09

No. 52 - Gosto de Teresa VIII

Teresa veste coisas do tempo
do tempo de outros, nela novo velho
E joga para cima o que pode agarrar com força
"Leve, mais leve, não segura tão forte, deixa que vai voltar, se você permitir..."


Gira, Teresa gira, gira e volta, seguindo em frente.
Neste retorno sem trono, rainha sente
sem rei
é dela, o que quiser
Com outros, ou sem


Teresa escuta, fala, falha
E aceita
ou não?


A busca não pára, movimenta
Movimenta, afeta afeta afeta
Afetada está
Teresa está.
Está, nem longe, nem perto...
sorri



21:23 - 11 de maio 2009... escutando teclas/motores/papos longe^perto.

fotos Festival da Índia - nas Ruínas de São Francisco, no Largo da Ordem - Ctba, numa tarde de domingo de abril 2009.